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Horário comercial

Há pouco mais de uma semana em São Paulo, o que eu mais ouço são reclamações sobre o transporte público. Não culpo quem as faz, entendo. É realmente desgastante e imprevisível. Ser imprevisível pode ser uma qualidade também, concordo, mas não nesse caso. Do transporte, tudo que espera-se é previsibilidade, pois nada é melhor do que chegar ao seu destino e sentir-se bem-disposto. O contrário do que os moradores de São Paulo experimentam todos os dias.

Lá fui eu para mais uma jornada. Sai de casa por volta das 2 pm e devo dizer: existe uma realidade alternativa que mora no horário comercial. Ele já leva esse nome para garantir a sua associação ao horário de trabalho. O que mais se pode fazer durante o horário comercial? 

Pois eu te conto: Sair sozinha, passear em um museu, desfrutar de um café, ir a um parque, caminhar, tirar fotos, conversar com trabalhadores que estão entediados, correr da chuva que costuma cair a tarde, parar em uma cafeteria desconhecida, ouvir a conversa das outras pessoas ao fundo da sua leitura, ouvir que a conversa de outras pessoas que falam outros idiomas também e lembrar que existe turismo e imigração no Brasil por mais que ninguém fale muito sobre isso, procurar um item que não seja muito caro no menu, pedir um sorvete gigante e sentir que exagera no açúcar, sem saber se a idade ainda tolera os abusos. E, é claro, dar uma corridinha até o metrô, antes do horário de pico. Com altos e baixos, o transporte público me levou e me trouxe do meu destino.

Foi o que eu fiz uma tarde dessas. No entanto, você deve estar pensando, quem é que pode sair, ou quer sair, enquanto todos estão trabalhando? O certo é também trabalhar, não? A resposta pode surpreender, mas a verdade é que os horários paralelos existem. Eles não só existem, como devem ser utilizados. Cada vez mais, as cidades grandes estão lotadas e parece que todas as pessoas querem sair no mesmo horário, ao mesmo tempo. Salve-se quem puder.

Sim, eu sei que essa é a realidade da maioria da população, e eu estou na condição de visitante. É um luxo poder usufruir do horário comercial para estar em outro lugar que não seja o trabalho. Eu sei disso muito bem, só quero mesmo provocar a reflexão. Indignação também serve. O intervalo entre a mudança de um emprego para outro, aquele banco de horas que ficou esquecido, aquela época da vida em que não se sabe bem para onde ir. Ainda que uma vez, permita-se viver o horário comercial de outro jeito. Vale a pena, quando a alma não é pequena.



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